Um bom sociólogo é um bom escritor
A primeira vez que estudei
sociologia foi como estudante de graduação na Brandeis University. Lewis
Coser e Philip Slater foram meus professores e exemplos. Eles me
convidaram para ajudar em uma tese e me ensinaram “como fazer
sociologia[3]” corrigindo meus rascunhos. Quando Coser realmente gostava
de um capítulo, ele rabiscava "Bravo" no topo da primeira página, e
então ele editava o texto com suas observações. O inglês foi a terceira
ou quarta língua que aprendeu, ele era um escritor muito bom e um editor
maravilhoso.
Eu fui para a faculdade em Berkeley em
1970. Os alunos em Berkeley quase não recebiam lições de como fazer
sociologia profissionalmente, comparado com o que Coser e Slater tinham
me ensinado. Eventualmente, eu entendi que minhas experiências de
graduação eram incomuns comparadas aos pós-graduandos mais típicos.
Em 1978, quando eu terminei a minha
dissertação, "publicar ou perecer" foi o meu lema. Essa é a lógica no
mundo de alta tecnologia de e-mail e internet conectando o mundo no
século XXI. O mercado de trabalho limitado para doutores significa que
uma carreira de sucesso como um sociólogo-pesquisador[4] requer ser um
escritor publicável e moderadamente produtivo. Mesmo com essa realidade
econômica, a pós-graduação, na maioria das áreas, ainda raramente
fornece preparação para uma escrita publicável ou para a carreira
docente. Bem ou mal, os professores mais bem sucedidos aprenderam a
escrever por conta própria.
Alguns anos atrás, fui convidado para
falar sobre ser um sociólogo em um seminário para novos estudantes de
doutorado no centro de pós-graduação da University of New York. Eu
aproveitei a ocasião para resumir algumas das coisas mais úteis que eu
aprendi ao longo dos anos sobre a escrita sociológica. Eu gostaria que
alguém tivesse dito estas coisas para mim. Como todos os conselhos,
essas "dicas, observações e princípios" não devem ser levadas ao pé da
letra.
1. Um bom sociólogo é um bom escritor
Tornar-se um bom escritor é um passo
inteligente para a carreira de sociólogo, pois o sociólogo é acima de
tudo um escritor. Para nós sociólogos, a escrita é a nossa ferramenta e
nosso ofício. Acadêmicos de todas as áreas, que escrevem bem, tem maior
facilidade para conseguir editoras e leitores. Escritores ruins e sem
graça tem dificuldade de serem lidos e levados a sério[5]. Poucos alunos
entendem isso quando começam a pós-graduação. Aprenda isso agora.
Compreenda que os grandes pensadores pensam em si mesmos como
escritores. Se você começar a pensar em si mesmo como um escritor, e
tentar se tornar um bom escritor, você estará se destacando da maioria
dos sociólogos.
Bons escritores têm sempre seus rabiscos
guardados. Anote sempre suas reflexões, mesmo que desorganizadas. Até
notas confusas e incompletas podem ser muito úteis mais tarde. Tome
notas sobre sua vida. Copie trechos de livros e frases interessantes que
tenha ouvido.
Bons escritores escrevem com frequência.
Quando for escrever uma correspondência não se prive de usar plenamente
as palavras. Escreva poesias, ensaios, notas de leitura e de campo,
experiências pessoais e descrições detalhadas de coisas que são
familiares a você. Mantenha diálogos por e-mail para escrever com
frequência. Escreva, escreva, escreva.
Para fazer uma boa sociologia nós
precisamos aprender as habilidades dos contadores de histórias e dos
grandes mestres de todas as áreas do conhecimento. E todos nós somos
obrigados a aprender por conta própria. Portanto, temos que aprimorar a
escrita por conta própria. Recomendo comprar, ler e reler The Elements
of Style de Strunk e White[6], e On Writing Well de William Zinsser. Os
escritores profissionais bem sucedidos estão sempre aprendendo mais
sobre seu ofício, mesmo quando eles estão revendo o que já sabiam e
esqueceram.
A primeira regra da boa escrita é:
escreva com clareza[7]. Você precisa tornar a sua escrita de fácil
entendimento para o leitor assimilar o que você está dizendo. Deixe a
mensagem clara e saia do caminho do leitor. Use frases curtas, varie o
comprimento das frases no parágrafo, e use palavras difíceis com
moderação. Até certo ponto é bom que o escritor “desapareça” do texto.
Ao escrever de forma clara você ajuda o leitor a aceitar que o que você
está dizendo é verdade. A ciência é em parte uma estratégia retórica.
A segunda regra da boa escrita é:
Escreva na voz ativa. Ou, escreva na voz passiva e depois metodicamente
edite seu texto de volta para a voz ativa[8].
Sociólogos tendem a focar em forças e
tendências sociais, enquanto deixando de mencionar (ou mesmo pensar) a
vida, a respiração, os atores humanos. Por exemplo: "O padrão foi
criado", "a política foi alterada", e "A companhia Ford Motors foi
processada".
Todas as três frases deixam em aberto
quem fez a criação, a alteração e o processo. A escrita na voz ativa
exige que nós deixemos os atores explícitos. Em vez disso, diga: "Os
Beatles criaram o padrão", "Eleanor Roosevelt mudou a política" e "os
parentes das pessoas que morreram em chamas processaram a companhia Ford
Motor". Se não conseguimos dizer claramente quem são os atores,
provavelmente precisamos de mais informações sobre os fatos ocorridos.
A terceira regra da boa escrita é:
Organize bem o seu texto. Quando eu era um estudante de pós-graduação,
um escritor de sucesso me contratou para ajudar a escrever um texto. Sua
única recomendação foi: "apenas certifique-se de usar segmentações de
A, B, C e 1, 2, 3 ". Ele quis dizer que uma texto deve ser bem
organizado, que os temas devem ser agrupadas em parágrafos e seções.
Seguir esse conselho e melhorar a organização de uma obra geralmente
envolve a organização da estrutura do texto. Portanto, a organização das
partes do texto é sua amiga.
A quarta regra da boa escrita é: Dar o
seu trabalho para várias pessoas, principalmente aqueles que escrevem
com clareza. Primeiro, peça que digam o que gostaram no texto, o que
ficou bom e o que acharam interessante. Todo leitor vai ter críticas.
Embora necessário, a crítica pode ser desanimadora. Os amigos sempre
irão demorar para lhe dizer o que acharam sobre seu texto. É difícil
conseguir deles uma resposta imediata. Então peça para darem exemplos
específicos de coisas que gostaram. Reafirme para eles em suas palavras
e a mensagem central do manuscrito. Mostre sede de conhecimento. Tente
produzir o que seus leitores gostam. Force seus interlocutores a sugerir
frases alternativas e soluções específicas para os problemas que eles
encontraram. E leve as sugestões a sério. Se dois leitores de confiança
encontrarem uma frase, parágrafo ou seção confusa, mude - mesmo se você
acha que é a melhor coisa que você já escreveu na vida.
A boa escrita vem da reescrita. Eu
costumo escrever pelo menos 4 a 6 rascunhos de coisas importantes, e às
vezes letra por letra. A reescrita significa releitura, olhando de novo e
de novo para as palavras, frases e sentenças desnecessárias e
inadequadas. Mark Twain disse uma vez "A diferença entre a palavra certa
e a palavra quase certa é a mesma diferença entre um raio e um
vaga-lume.".
A quinta regra da boa escrita é: Edite o
trabalho de outras pessoas. Este é, de fato, a única maneira de se
tornar competente em editar o seu próprio trabalho. É muito mais fácil
ver os problemas em escritos de outras pessoas do que no seu.
Edite o seu trabalho, divida suas
sentenças. Corte suas redundâncias, reorganizar seus parágrafos,
reescreva suas sentenças na voz ativa, dê alternativas para frases, peça
para desenvolver melhor as ideias mal formuladas. A longo prazo, a
edição generosa que você fizer aos outros será a ação mais egoísta que
você já fez. Escrever é um trabalho solitário. Escritores ficam sozinhos
por muito tempo, olhando o texto no papel ou na tela do computador,
dialogando com ele. Ao editar o trabalho de outras pessoas, escrever
para pessoas que conhecemos, aprender o que os leitores inteligentes
gostam de ler, incorporando as sugestões ao texto, isso torna o trabalho
menos solitário e muito melhor.
2. Escrever uma pesquisa: contar histórias a partir de dados.
Nosso trabalho como sociólogos,
estudiosos, escritores e professores, é contar histórias. Nunca se
esqueça, e nunca aceite qualquer interpretação do seu trabalho que não
inclua a ideia de que você é um contador de histórias. Você é um
contador de histórias que conta histórias reais.
Para contar boas histórias é preciso
dados, geralmente dados fieis, e se possível de muitos dados. Somente
com dados fieis se pode escrever uma boa história. Os dados vêm em todas
as formas - números, imagens, palavras, gravações, artefatos, pixels, o
que seja. Ao contrário do que pensam muitos estudantes de
pós-graduação, sociólogos e jovens universitários que estão tentando ter
suas pesquisas publicadas, os dados obtidos sem teoria são melhores do
que estudar uma teoria sem relacionar com dados.
Para obter boas informações é preciso
fazer uma pesquisa antes. Temos que sair de casa, conseguir os dados,
trazer para casa, e trabalhar com eles. Felizmente, as pós-graduações de
Sociologia dão suporte para a aprendizagem das técnicas básicas de
pesquisa, outra possibilidade é encomendar a captação dos dados através
de empresas de pesquisa[9] que podem fazer um ótimo serviço. Para a
maioria dos projetos de pesquisa é fundamental ter curiosidade,
persistência, sorte e algum recurso.
Para contar boas histórias a partir de
dados, nós temos que perceber o que interpretamos e o que queremos
dizer. Isso requer reflexão. A maior parte do tempo, o escritor passa
pelo processo de bloqueio de escrita. Às vezes, o bloqueio na escrita é
causado por falta de dados, e para resolver isso temos que refletir
sobre o que temos. Se você achar que está com bloqueio para escrever é
preciso tomar isso como um sinal de que está precisando pensar mais
sobre o que está tentando escrever, e que também pode precisar de mais
informações. Temos de encontrar histórias para contar usando a
interpretação dos dados.
Todo mundo faz alguma reflexão enquanto
está escrevendo. No entanto, muitos problemas são resolvidos longe do
teclado. Andar, caminhar, tomar banho, andar de bicicleta, dirigir, ler,
ouvir música, ou simplesmente se encostar em uma parede às vezes pode
estimular a reflexão e a escrita para algumas pessoas. Conversar com
amigos e colegas também pode ajudar muito. E alguns escritores só
conseguem refletir sobre os dados quando estão escrevendo. Nesse caso,
reescrever é ainda mais importante.
Encontre um modelo de formato de
pesquisa[10]. Livros e artigos acadêmicos que tenha afinidade como o
trabalho que você quer fazer. Se não podemos encontrar bons exemplos do
tipo de pesquisa e de forma de escrita que nós queremos fazer, nós
provavelmente não teremos condição de executar esse projeto.
Busque ler periodicamente revistas de
alto nível acadêmico. Um sociólogo sério é um verdadeiro intelectual,
alguém que joga de forma criativa com ideias e linguagem. Por isso, leia
os melhores intelectuais que escrevem na atualidade. Estude suas obras e
imite. Compre seus livros, ou pegue na biblioteca emprestado e leve
para casa, mesmo que não vá conseguir ler tudo. Todos os bons estudiosos
fazem isso. Para ser um intelectual competente também é preciso
aprender a história do que se estuda. Quanto mais se sabe sobre a
história do nosso tema, mais fácil será escrever sobre ele em qualquer
campo, e melhor o trabalho fica.
Ao escrever um artigo, eu recomendo
começar trabalhando com dados específicos, com um caso, e no final
buscar desenvolver generalidades a partir dele. Use a teoria para
explicar os dados. Conte a história a partir dos dados empíricos se
orientando pela teoria. Depois de apresentar as interpretações sobre os
dados, se assim desejar, poderá sair de trás “das cortinas” e explicar
melhor as suas intenções no texto. Ao contrário de historiadores,
sociólogos tendem a fazer o oposto - a começar com uma generalização ou
hipótese. Eu acho que os sociólogos têm muito a aprender com
historiadores sobre contar histórias.
Fazer um argumento é criar uma história.
Um trabalho científico deve apresentar uma ou duas mensagens centrais e
argumentos que os apoiem. Um trabalho deve narrar os fatos em torno do
objeto de estudo e buscar traçar uma generalidade a partir deles. A
teoria é uma história contada em um nível um pouco mais elevado de
abstração, no entanto, não passa de uma narrativa. Se algo não pode ser
contado como narrativa, então não faz sentido. E, se algo não faz
sentido, não faz sentido contar. Porém, não tenha medo de não fazer
sentido. As mesmas perguntas que podem ser impostas ao seu trabalho
podem ser aplicadas ao trabalho de qualquer outra pessoa: Qual é o ponto
defendido? Qual é o argumento? Qual é a história?
Desenvolva relacionamentos com outras
pessoas que estão estudando o mesmo tema que o seu ou temas semelhantes.
Leia seus escritos, converse por e-mail, fale com eles por telefone.
Tente fazer deles seus amigos. No século XXI, temos a possibilidade de
manter relações de trabalho, e até mesmo amizades íntimas com as pessoas
que raramente vemos.
Escrever e pesquisar com outra pessoa
pode ser algo divertido e produtivo. Duas pessoas podem ser mais
espertas do que uma, e um trabalho escrito por duas pessoas pode ser
mais interessante do que qualquer trabalho que uma das duas poderia
fazer sozinha. Mas a colaboração entre duas pessoas não torna o trabalho
menos complexo. Um bom trabalho escrito por duas pessoas leva pelo
menos duas vezes mais tempo para ser feito do que um trabalho escrito
por uma pessoa. Para fazer um bom trabalho sociológico, muitas vezes é
necessário conhecer a fundo pelo menos duas áreas do conhecimento. Para
fazer uma boa sociologia histórica, antes eu tenho que trabalhar bem com
a sociologia e com a história. Ter a expertise em dois ou mais campos é
necessário para muitos tipos de projetos de pesquisa e áreas de estudo.
É necessário muito esforço para alcançar profundidade em dois campos,
mas as recompensas pessoais, intelectuais e profissionais são
substanciais.
3. Ser um sociólogo
Meu velho amigo, Jerry Himmelstein,
escreveu um trabalho de graduação em seu último ano na Universidade de
Columbia. Jerry trabalhou arduamente durante todo o ano. Nas últimas
semanas ele virava dias e noites para concluir o trabalho. Já exausto,
ele entregou a monografia no escritório de seu orientador. O orientador
pegou calhamaço pesado, folheou-o brevemente e disse:
"Bom trabalho Himmelstein - você está querendo ir para a pós-graduação em sociologia, não é?"
"Sim, eu estou", respondeu Jerry orgulhosamente.
"Bem", disse o professor, "se você
trabalhar duro, e se você for muito bom, você conseguirá fazer isso para
o resto de sua vida."
Por que alguém iria querer fazer isso ?
Estou feliz de ser um sociólogo por
várias razões, sobretudo por não ser um trabalho tão alienante. Gosto de
ensinar e agora estou ficando muito bom nisso. Mas eu tenho sido
contratado, pago, e promovido para aprender coisas e escrever um pouco
do que eu aprendi. A escrita ainda hoje é algo difícil para mim, mas o
aprendizado é fantástico. Como sociólogo eu posso estudar sobre quase
tudo que eu quero.
Uma das melhores coisas de ser um
sociólogo, é que podemos ir a qualquer lugar, não ver nada, não ler
nada, não falar com ninguém, e sempre poderemos dizer que estávamos
fazendo trabalho de campo. E pior que podemos realmente estar fazendo
trabalho de campo. Ninguém sabe o que será útil para nossos escritos ou
nossas aulas - e nós certamente também não sabemos. Como disse Edward
Brecher, “certas coisas não aparecem no resultado”.
O nosso trabalho como sociólogos é
aprender as verdades sobre o mundo social para escrever sobre elas.
Grande parte do tempo, talvez a maior parte do tempo, nós não podemos
estar indiferentes ou desinteressados. Mas podemos ser honestos e
sinceros sobre o que interpretamos. O mundo real é feito de seres
humanos e dificilmente é da forma como gostaríamos que fosse. As ações
das pessoas, palavras e criações são muitas vezes surpreendentes, até
mesmo peculiares, estranhas ou bizarras. Nossa tarefa como sociólogos é
descrever de maneira mais clara e honestamente possível alguma parcela
do mundo social. Se você não acredita que existam coisas verdadeiramente
importantes a serem ditas sobre o mundo social e sobre o que as pessoas
fazem, então você está no campo errado. Considere uma carreira no
direito, filosofia ou economia.
Sociologia é uma ciência. Não é uma
ciência puramente positivista ao molde das ciências naturais. Mas faz
uso de muitas das ferramentas lógicas e empíricas das ciências naturais.
Todas as ciências, incluindo a sociologia, procuram descrever e
compreender o mundo. Mas a sociologia é também uma forma de arte - entre
muitas outras razões, porque é uma variedade de literatura. (Robert
Nisbet tem uma boa discussão sobre isso em seu livro, A sociologia como
uma forma de arte[11]).
Em Perspectivas Sociológicas: uma visão
humanística[12], Peter Berger diz que a sociologia não é definida pelo
que ela estuda, nem pelas teorias e métodos que utiliza. Ele diz que a
sociologia se distingue por suas perspectivas, especialmente pela sua
desconfiança em relação aos dados obtidos. Berger oferece o que ele
chama de “primeira verdade sociológica". A ideia de que um campo
acadêmico tem uma "primeira verdade" é inteligente e ousado. A primeira
verdade da sociologia de Berger é: as coisas não são o que parecem ser.
Eu gosto muito desse conceito.
Berger aponta quatro características que
ele considera centrais na escrita sociológica. Ele chama de
desmascaramento (desmascaramento no sentido de revelar a verdade sobre
algo), não-respeitabilidade (olhar o mundo a partir da perspectiva dos
não-respeitáveis, os perdedores), relativização (compreensão de que
quase tudo depende do contexto), e cosmopolitismo (uma valorização da
visão cosmopolita e da diversidade humana). Eu amo fazer uma ciência com
essas características. Todas essas características são importantes, mas
acho que a primeira é a mais importante. No mesmo sentido de Berger,
eu afirmo que os sociólogos bons são bons contadores de histórias, que
mostram que as coisas não são como parecem ser.
Eu sou um wrightmillsiano. Eu acredito
que decifrar os sentidos do mundo é um trabalho fascinante e útil. Eu
amo interpretar o mundo, e para isso eu preciso de uma representação
grande para poder me orientar e ter um parâmetro. Rotineiramente, eu
busco entender quem eu sou, o que eu quero, e o que eu sinto a partir da
observação do contexto histórico em que estou inserido em relação a
minha biografia. Eu entendo minha própria vida visualizando-a no
contexto político, econômico, cultural, institucional e histórico. Eu
acredito que a imaginação sociológica pode realmente ajudar as pessoas -
coletivamente e individualmente - para melhorar suas vidas, as tornando
mais felizes, mais saudáveis e mais eficientes em tudo que fazem.
Acredito que com mais força do que nunca.
4. Boa escrita como uma tradição sociológica.
Para C. Wright Mills, escrever bem era
fundamental para a tarefa de interpretar o mundo social. Para Mills,
entre as qualidades importantes que faziam seus heróis - Emile Durkheim,
Max Weber, Karl Marx, Georg Simmel, Sigmund Freud, W.E.H. Lecky, Jackob
Burckhardt, W.E.B. DuBois, Robert Park, Karl Manheim, Charles Beard e
Thorstein Veblen - a principal era a de que todos eram escritores bons
ou muito bons habilidosos com as palavras. O que há em comum na maioria
dos sociólogos bons ou apenas lidos na minha geração, nas gerações
anteriores, de vertentes políticas e perspectivas sociológicas
distintas, é que todos se viam como escritores e trabalharam duro para
conseguir uma boa escrita. Certamente, alguns sociólogos, a partir de
Talcott Parson a Harold Garfinkle, tiveram uma escrita densa, pesada, e
prosa com jargões cheios. Porém a escrita mais didática também tem se
mantido como uma tradição forte dentro da sociologia. Por exemplo, a
partir de meados dos anos 1930 até meados dos anos 1970, junto com C.
Wright Mills e Peter Berger, outros foram surgindo:
Robert Lynd, Helen Lynd, Lewis Coser,
Rose Coser, Phillip Slater, Alice Rossi, David Reisman, Everett Hughes,
Helen Hughes, Howard Becker, Robert Merton, Louis Wirth, Mirra
Komarovsky, Alvin Gouldner, Paul Cressy, Oliver Cox, Alfred Lindesmith,
Seymour Lipset, William F. White, Dennis Wrong, Jessie Bernard, Nathan
Glazer, Elliot Liebow, Ralph Miliband, Vance Packard, Robert Nisbet,
Erving Goffman, Norbert Elias, Betty Friedan, Michel Foucault, Irving
Zeitlin, Eric Fromm, Phillip Reiff, Ralph Daherndorf, Herbert Blumer,
Arthur J. Vidich, Joseph Bensman, Ned Polsky, Ernst Becker, Robin
Williams, E. Digby Baltzell, Joseph Gusfield, John Seeley, Raymond Aron,
William Domhoff, David Matza, Robert Blauner, Kingsley Davis, Reinhard
Bendix, Herbert Gans, Daniel Bell, e Kai Erickson.
Na mesma época, boa parte dos bons
antropólogos, historiadores, cientistas políticos, geógrafos, linguistas
e filósofos também eram escritores hábeis. Suas obras importantes
resistem e continuam a ter importância para os estudantes e
pesquisadores, em parte, porque essas obras geralmente foram bem
estruturadas em termos da frase e de parágrafo. Têm surgido muitos
cientistas sociais que são bons e bem sucedidos, porque eles têm algo
importante a dizer e dizem isso bem. Devemos aprender com os seus
trabalhos e exemplos. No final, somente existem duas tarefas
profissionais para o sociólogo - descobrir o sentido das coisas através
do trabalho sociológico e escrever sobre ele com habilidade.
Harry G. Levine, Departamento de Sociologia, Queens College e Centro
de Pós-Graduação, Universidade da Cidade de Nova York, Flushing, Nova
York, 11367. e-mail:
HGLevine@compuserve.com
Harry G. Levine
Departamento de Sociologia
Queens College, City University of New York
Tradução de Pedro Jorge Chaves Mourão
[1] Agradeço a contribuição dos amigos Vinicius Frota, Napoleão Araujo Neto, Carlos do Valle, Diego de Almeida Alves
[2] Artigo originalmente publicado em http://dharma.soc.qc.cuny.edu/soc/faculty/pages/levine/docs/a-good-sociologist.html .
[3] No original “how to write sociology”.
[4] Aqui ele faz uma distinção entre o ofício de sociólogo como pesquisador e como professor.
Nos EUA essa diferença é mais clara devido a diversidade do mercado
de trabalho, já no Brasil essa distinção ainda é pouco aparente.
[5] Um indício do fenômeno que Levine descreve pode ser percebido na
transformação linguística através das redes sociais eletrônicas e
microblogs, como facebook e twitter. Dificilmente, as pessoas leem
textos grandes e complexos nas mídias digitais, que cada vez mais ganham
espaço no cotidiano dos leitores.
[6] Ambos sem tradução para o português:
STRUNK, Jr., William; E.B. White. The Elements of Style. Boston: Ed Allyn & Bacon, 2009.
ZINSSER, William Knowlton.On writing well : the classic guide to
writing nonfiction.New York: Ed First HarperResource Quill, 2001.
Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2012.
[7] Lembro que durante minha própria pós-graduação meu orientador,
Domingos Sávio Abreu, sempre fazia a recomendação: Escreva como se sua
avó fosse ler. Com isso ele queria dizer para que eu não fosse prolixo
na escrita.
[8] Um exemplo de voz ativa: O deputado roubou o povo. Na voz passiva seria: O povo foi roubado pelo deputado.
[9] No mercado norte-americano existem diversas empresas que fazem
pesquisa de mercado, pesquisa de opinião e até especializadas em
pesquisas acadêmicas.
[10] Aqui o autor se refere à busca por um trabalho que possa orientar na confecção da estrutura da monografia.
[11] NISBET, Robert. A sociologia como uma forma de arte [orig.
ingl.1962]. Trad.S.Garcia.Re.técn.H.Martins.Plural,Revista do curso de
pós-graduação em sociologia da USP, São Paulo, n.7, pp.111-130,10
sem.2000. Disponível em:
http://www.fflch.usp.br/ds/plural/edicoes/07/traducao_1_Plural_7.pdf
[12] BERGER, Peter I. Perspectivas Sociológicas – uma visão humanística. Petrópolis: Vozes, 1986.