domingo, 12 de agosto de 2018

Sobre transparência na sociedade



Transparência é uma daquelas palavras positivadas socialmente. Possivelmente, porque associa-se com a ideia de "clear" - limpo. 

Uma vidraça transparente é considerada limpa, um copo cheio de água transparente indica condição de consumo.

E se fosse possível fazer uma pesquisa histórica da predominância e uso do termo, certamente muitos outros paralelos iriam enriquecer esta positividade.

Mas, também o conceito "transparência" pode ser negativado. Por exemplo, quando se faz referência a algo vazio. Algumas pessoas quando se referem a um assalto, dizem: "limparam tudo". É tanto uma referência no sentido dos itens que foram roubados, quanto a ausência de pistas para incriminação.

Mas é interessante observar como Byung-Chul Han faz uma crítica ao elemento transparência ao considerá-lo como coação e coerção social. 

Nas palavras dele: "A transparência estabiliza e acelera o sistema, eliminando o outro ou o estranho. Essa coação sistêmica transforma a sociedade da transparência em sociedade uniformizada (gleichgeschaltet)".

A busca por "produtividade", ou seja, resultado rápido condiciona a vida de maneira que todas as propostas sejam ajustadas para este fluxo. Ele é o indicador de transparência, é o padrão de limpeza, daquilo que não será considerado sujo.

Sendo assim, tudo o que se submete a esta coação ajusta-se ao sistema e permite potencializar seu fluxo. Tudo o que se opõe a coação passa a ser considerado inadequado não porque de fato é inadequado, mas simplesmente porque não atende a transparência, limpeza e fluidez que o sistema exige.

O perigo maior está na transparência coativa aplicada nas relações sociais que fazem descartar o outro, o diferente, que passa a ser considerado sujo e um atraso para a fluidez do sistema.

É um ajuste lógico forçado que despreza o subjetivo.
Para além da descartabilidade está o fato da uniformização reforçada. Até onde posso compreender e explorar a palavra "gleichgeschaltet", ela não apenas indica a uniformização em si, mas a própria disposição/indução do indivíduo/sujeito que se sujeita - por isso, entrega-se a coação uniformizadora.

Estes processos estão se tornando tão intensos na vida de modo que esta forma única/uniformizada de vida torna-se insuportável, porque quer dominar com conformidade exclusiva e apagar a diversidade da própria vida.

O que decorre na prática acerca disso são os ainda intensos processos de homogeneização que não cansam de buscar o poder absoluto do humano servil.

Até lá, juntam-se corpos desanimados, desiludidos, caídos de tanto correr em busca de uma saída. 

Então, a partir de agora, quando se falar em transparência, questione sobre seu real sentido e implicação. 
E, se achar impróprio, deixe a vidraça suja mesmo, e da água colorida faça o suco de sua preferência.

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Ederson Menezes (licenciado em sociologia, especialista em educação e  mestre em práticas socioculturais e desenvolvimento social)

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